Caminhada da Seca em Senador Pompeu reúne mais de 6 mil pessoas

Foto: Alex Pimentel

Vítimas da seca de 1932 recebem homenagem dos agricultores do Sertão Central em ato que chega à 3ª década

Foto: Alex Pimentel

Senador Pompeu. A Caminhada da Seca chegou, ontem, a sua terceira década em Senador Pompeu, repetindo o ritual em homenagem às vitimas da seca de 1932. Dessa vez, o pároco João Melo dos Reis passou a guiar os fiéis, da igreja matriz de Nossa Senhora das Dores até o cemitério da barragem, onde estão sepultados os flagelados mortos no campo de concentração do açude Patu.

Por estradas carroçais, a multidão enfrentou o calor e a sede para repetir o gesto de homenagem às vítimas do flagelo da grande seca e que levou milhares de sertanejos à morte em um campo de concentração.

Nos últimos oito anos, essa tarefa foi do padre Roberto Costa, atualmente instalado em Iguatu. Este ano o movimento teve como tema “Caminhada ao campo-santo do sertão, por cidadania e vida digna no semiárido”, constituindo-se, assim, segundo o pároco, numa forma de expressar a ânsia do povo sertanejo por dias melhores. Coincidentemente, em 2012, o Ceará atravessa a pior seca dos últimos 30 anos.

Madrugada

Mesmo assim, a romaria seguiu pelos seis quilômetros de estada carroçável sinuosa até o cemitério da barragem. Quando partiram do Centro de Senador Pompeu, o clima ainda estava agradável pela madrugada. Quando o sol surgiu, trazendo o calor, o cortejo continuou seguindo os passos do sacerdote.

Muitos seguidores estavam descalços, trajados de branco, com a explicação de que estavam pagando às “almas santas”, justificava a agricultora Maria Anunciada. Ela disse que havia motivo para estar ali. Além da devoção, desde 1982, quando o padre Albino Donatti, a época pároco da freguesia de Nossa Senhora das Dores, deu início a campanha, ela também tinha gratidão para pagar.

Pregação

Pelos cálculos dos organizadores mais de seis mil pessoas participaram da caminhada. No intervalo de uma pregação do pároco para outra, enquanto caminhavam, alguns comentavam o assassinato de duas mulheres dias antes, encontradas mortas naquela estrada santa. Para os mais religiosos eram mais duas almas a se tornarem santas. Para os céticos, reflexo da realizada enfrentada nos dias atuais.

“Antes somente a seca era violenta e matava por aqui. Hoje, o homem é o principal responsável por essa violência. Precisamos de cidadania e vida digna, como pregou o padre João Melo”, comentou um peregrino se referindo a missa campal à frente do cemitério.

A celebração eucarística teve à frente o bispo da diocese de Iguatu, dom João José Costa. Além do atual pároco de Senador Pompeu, os padres Roberto Costa e João Paulo Giovanizzi, autor da obra literária “Migalhas do sertão”, com a qual norteou várias pesquisas sobre o campo de concentração e as vítimas do flagelo da seca de 1932 neste município do Sertão Central, colhendo o testemunho de 12 sobreviventes, também participaram do culto. Foi momento de reviver a penúria provocada no “curral da fome”, como o acampamento improvisado ficou conhecido, onde milhares de retirantes foram obrigados a permanecer, muitos até morrer, transformados nas “almas da barragem”.

“Viva as almas da barragem. Viva as santas almas do povo”, diziam em coro os caminhantes. Mais uma vez após o culto celebrado diante do monumento erguido em homenagem aos mortos da barragem, a multidão invadiu o campo santo, acendendo velas e orando em silêncio diante dos túmulos.

Quem não conseguiu entrar e tinha pressa de retornar para casa se ajoelhou diante do cruzeiro, na porta do cemitério. O sol parecia esquentar mais e mais a cada minuto.

As sombrinhas protegiam do sol, mas o mormaço era desagradável, principalmente para os idosos e as crianças. Logo, dezenas de chamas esquentavam ainda mais o clima ao redor. Mas como nos anos anteriores, para refrescar, era distribuída água, gratuitamente, com os fieis.

Além da Caminhada, durante a semana dezenas de atores encenaram na cidade o espetáculo cênico “Campo de Concentração de 1932”. A peça, de autoria do advogado Valdecy Alves, também dramaturgo, e dirigida por Fram Paulo da Silva, com interpretação dos artistas de teatro integrantes dos grupos artísticos Cia. Engenheiros da Arte e Arautos do Bonfim, realizada pelo Instituto Casarão de Cultura e Cidadania, foi apresentada na cidade pelo quinto ano consecutivo. Este ano, além de Senador Pompeu, a peça está sendo programada para apresentações em várias cidades do Ceará. O calendário da turnê ainda não está concluído, explicou o diretor.

Mais informações:

Paróquia de Nossa Senhora das Dores – Senador Pompeu

Telefone: (88) 3449.0069

Instituto Casarão

Telefone: (88) 9674.0110

Fonte: Diário do Nordeste

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